Aquela noite

São três da manhã. Sento-me na beira da cama, com o luar nas minhas costas e o meu coração afastado de ti. Sinto o tecido do lençol a escorregar de em redor das minhas ancas.
Passo a mão pelo cabelo, despenteando-me, e a minha pele arrepia-se involuntariamente.
Olho para ti. Adormecido, como só os sonhos te sabem embalar. Tens o cabelo caído sobre os olhos, e as minhas mãos tremem quando me impeço de te tocar. Tenho medo que te desvaneças se me mexer demasiado depressa.
Porque se este for um sonho, raios me partam se alguma vez quererei acordar.
Não estava à espera que voltasses. Depois de termos gritado até os nossos corações sangrarem, e as nossas almas se esconderem num recanto perdido de nós, saíste da nossa casa com a porta a bater atrás de ti, qual presságio que tu, a pessoa que mais importa para mim, estava prestes a sair da minha vida.
Senti-me a estilhaçar quando te vi desaparecer. Não é que não possa viver sem ti. Sei o suficiente da minha pessoa, para saber que, eventualmente, acabaria por sobreviver.
Apenas não quero fazê-lo.
Então... quando te vi a ajoelhares à minha frente... Céus... Acho que nem tinha dado por me ter deixado cair para o chão, na dor que me asfixiou e me deixou sem voz. Os teus braços puxaram-me para ti, e quis, quero nunca mais sair de perto de ti.
Agora...
Fecho os olhos, e envolvo-me com os meus braços. Tenho tanto medo de me deixar perder, de me deixar levar por ti novamente, apenas para te ires embora outra vez.
Esfrego o rosto. Uma ansiedade cresce dentro de mim, ameaçando irromper-me e afundar-me.
O meu corpo treme, e as lágrimas começam a cair pelo meu rosto. Quem disse que dizer Adeus por uma segunda vez poderia não ser tão doloroso como da primeira? Choro por aquela rapariga sem medos, sem inseguranças, que a dada altura se sentiu nas nuvens com o seu primeiro amor e agora se destroça com ele.
Sinto-te a mexer do meu lado. Os soluços abandonam a minha garganta, sem que eu os consiga controlar. Os teus braços rodeiam-me e quase que liberto um suspiro de alivio pelo teu toque. Puxas-me para o teu peito, passas as mãos uma e outra vez pelo meu cabelo, tranquilizando-me, marcando-me, mudando-me irremediavelmente, mesmo que eu não queria, mesmo que me custe horrores se te voltares a ir embora.
A tua voz acalma-me, no entanto. Infiltra-se no meu ser, desembainhando a sua espada e predispondo-se a lutar por ele.
Olho-te nos olhos. Uma tranquilidade que nunca te antevi transparece neles, e algo como... saudade.
Promessa.
Beijas-me a ponta do nariz. Rio-me, pelas cócegas, pelo gesto tão familiar. Aconchego-me ainda mais de encontro a ti. Parece impossível, mas és o meu vicio mais pretensioso, e sei o quanto será dificil saíres-me da pele.
Beijas-me. Uma e outra vez. Na testa, no nariz, em cada centímetro de mim, que já te pertence de qualquer das maneiras.
E, apesar de palavras não serem proferidas, porque às vezes, para que é que realmente precisamos delas, sei que prometemos amar-nos.
Custe o que custar.
Porque às vezes é o que basta.

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